Pedro Gonçalves

Pedro Gonçalves (PG) - O ponto mais alto em Pista: Com o Salgueiros, quando participei (20 anos) no Campeonato Nacional em 1500 metros (a "distância perfeita"), mas tenho que admitir que nem fui profissional, nem fui "grande atleta" (bem grande sou…loll). Em estrada a Meia Maratona da Nazaré, tinha 21 anos, quando bati a minha MMP, não contava, nem tão pouco treinei para isso, apenas fui lá para fazer um treino longo e acabei por fazer a meia-maratona, para mim foi mítico fazer MMP na "Mãe de todas as Meias Maratonas em Portugal"

Mais recentemente em estrada recordo os 2 campeonatos nacionais de bancários que ganhei (absoluto), para mim foi um orgulho.

TP - Como surgiu esta paixão pelas corridas de montanha, depois de tantos anos como atleta de pista e estrada?

PG - Estava saturado de pista e estrada, já não aguentava mais, por outro lado, apesar da vida atarefada que levo, verifico que a montanha me faz relaxar, esqueço os meus problemas e stress (e como todos não são poucos), no monte sou eu e a natureza. Por outro lado sempre gostei de correr pela montanha, tenho um  "bom quintal" ao perto… Tudo isto aliado à influência do meu "irmão galego – andaluz – catalão - português", Fran, fizeram com que eu me dedica-se ao trail. Depois conheci, já conhecia pela TV, revistas, de ver em provas, o Sá e aliado à sua simplicidade como pessoa e todos sabem bem disso, ainda me "empurrou" mais para este desporto…e cá estou.

TP - Quais as principais diferenças encontras entre os atletas de pista e estrada, e os atletas das montanhas?

PG – Acima de tudo a solidariedade e camaradagem. Eu creio que o atletismo de estrada cria nos atletas de pelotão um sentimento de alguma rivalidade, eu sei bem do que falo. No trail, não deixando de haver rivalidade, existe maior camaradagem e esse fenómeno explica-se pelo facto de nós como animais que somos estarmos em contacto com os nossos padrões básicos, ou seja, com a natureza. Por outro lado a adversidade provocada pelos obstáculos naturais, próprios do trail, cria no meu entender uma “corrente de solidariedade” entre os atletas, quantas vezes nos viramos para trás para ajudar um “adversário” a subir, por exemplo, um muro?...

O trail running é um fenómeno de crescimento exponencial à escala do atletismo, algo recente (principalmente em Portugal), um desporto um pouco “pirata” que ainda não é dominado pelas grandes “marcas” (para já), um desporto no seu estado puro, pelo menos este é o meu entendimento.

Por último e não menos importante, focalizo a minha atenção em algo que ajuda a manter um espírito de sã convivência… se reparares neste desporto é comum, no final das provas, haver um convívio seja um piquenique, um almoço, etc e porquê? Simples, este desporto desenvolve-se, normalmente, em zonas mais ou menos longe dos grandes centros urbanos, isso leva a que os atletas após a sua prova simplesmente não tomem o seu banho e se dirijam para suas casas…  aqui existe o hábito de ficar a tomar uma refeição, confraternizar e isso leva ao “estreitamento de laços” entre os atletas.

TP - Quais as diferenças que encontras entre os treinadores de pista que tiveste e o teu atual treinador, Paulo Pires?

PG – Acima de tudo não se pode estabelecer paralelismo entre 2 metodologias diferentes. Na pista treina-se muitas vezes a vertente anaeróbica, a velocidade e rapidez de reacção, técnica de corrida, com muitas repetições de exercícios. Os exercícios e treinos são mais curtos e intensos.

O Paulo, perfeito conhecedor do trail, trabalha mais a vertente aeróbica , não convém esquecer que um ultra-maratonista vai estar muitas horas em competição e isso só se consegue com bom treino prolongado, controlando muito bem a FC. Notei acima de tudo uma maior necessidade de auto-controlo, a vertente psicológica também é muito importante, numa prova longa muita coisa pode acontecer e só treinando é que se previne (e mesmo assim).

O Paulo é um treinador com provas dadas, basta verificar que (se não me engano) no ultimo UTMB, a certa altura, era o único no mundo com 2 atletas no top-ten, o Armando e o Sá… notável.

TP - Pelo que sei, tens um horário de treinos diário que para muitos pode ser estranho, que é treinar de madrugada. Porquê essa opção?

PG – “é pelo bagaço” … lollll Agora a sério, essencialmente para ter tempo para a família. Ao fim do dia nunca sei a que horas chego a casa e optei por esta solução para lhes dar a devida atenção.

Por outro lado adoro correr pela manhã, sentir o ar fresco na cara, ver as pessoas a acordar, como corro junto ao rio Minho (meu circuito de treino), sou brindado por paisagens indescritíveis. Estes anos todos já sou uma figura conhecida, até tenho um claque de “apoio” (lollll), uns velhotes que se juntam num tasco no centro de Monção, por volta das 6 horas da manhã, hora de abertura (sagrada) do mesmo. Tenho vários episódios desta veia “madrugadora” como uma perseguição policial pelas muralhas de Monção, confundiram-me com um potencial ladrão, que deu origem a uma gargalhada entre mim e os GNR´s que me perseguiam, só me apanharam de carro e porque eu, estupefacto parei… até episódios tristes como um atropelamento (de propósito, ia correctamente na minha via e larga…), por indivíduos embriagados, enfim isso não interessa, o que interessa é que tenho todo o prazer em me levantar bem pela manhã e fazer aquilo que gosto, para mim cada dia é um dia positivo pela frente.

TP - És vegetariano. Que conselhos dás aos atletas que desejariam ser vegetarianos, mas que não o são porque tem receio que seja uma "fraca" alimentação em termos nutritivos para corridas tão exigentes?

PG – Ser vegetariano é uma opção de vida, não a tento impor a ninguém e muito menos à minha família, optei por este estilo porque me faz sentir bem e já agora ao preço que a carne e o peixe estão….ehehehe

O receio, para mim, é infundado: é uma questão de hábito alimentar, de escolher correctamente os alimentos, faço análises regulares e tudo está bem, nas provas não sinto diferença. Já agora, alguém sabe que arroz com feijão tem o mesmo poder nutritivo que a carne? Porém não tenho nada contra quem gosta de um bom bife, ou de um bom bacalhau…são opções…

Já agora a D. Odete (mais conhecida por Xana) é uma excelente cozinheira vegetariana, receitas vegetarianas é com ela…eu como cozinheiro é mais o estilo tofu ou seitan, acompanhado por salada mista… lolll.

Já agora sabias que existem Francesinhas Vegetarianas? O Peza Arroz e Mãe Preta, são pioneiros… não sei quem influenciou…

TP - Actualmente formaste a "Desnível Positivo - Associação Desportiva e Recreativa Luso-Galaica" e a equipa "Desnivel Positivo/Sportzone", as quais te assumiste como presidente. Em que consiste este projecto e quais os seus principais objetivos?

PG – O Desnível Positivo é para mim um desafio pois conto com pessoas envolvidas de grande “craveira” pessoal e atlética. O projecto Desnível Positivo, que lembro está a dar os seus primeiros passos, visa ser um projecto diferente e pioneiro no Trail. A reorganização num clube dos atletas de trail visa dar um maior contributo á visibilidade dos mesmos. Creio que conseguimos maior apoio na envolvência das pessoas e na sua organização, pretendemos dar visibilidade ao atleta, esse é o mote do clube, mas não só, também pretendemos “chamar” para as caminhadas de montanha, para o trail, tantas pessoas e atletas que neste momento estão “arredados” destas lides.

A experiência em termos associativos minha e de Fran deu-nos uma panorâmica do projecto que pretendíamos levar “por diante” e assim surgiu o “Desnivel Positivo”. Não queremos ser os maiores, mas sim a REFERÊNCIA do trail em Portugal, a formação de um clube virado para o trail é um grande passo nesse sentido.

Conto neste projecto com gente de muita valia, apesar de ser o presidente não deixo de ser mais um a colaborar, porém não posso esquecer aqueles que comigo repartem a direcção como seja o Fran e o Sá. A entrada do Sá, constitui, por si, um grande desafio pois estamos perante a referência do trail nacional e o seu maior expoente, um atleta de craveira internacional reconhecidamente e não podemos descurar isso.

Devo referir ainda, todos aqueles que tem ajudado a erguer este clube, como sejas tu, a Auxi, Xana,, gosto de ver pessoas com o entusiasmo do Luis Freitas, de Manu (uma pessoa excepcional que desenhou o logo), da sua esposa Angeles (Tara), não esquecendo ainda alguns atletas do clube (que não enunciei) como sejam o Joaquim Sampaio (esse eterno jovem), Rui Seixo, Ricardo Basto, Jorge Azevedo, José Pereira, além de outros (e outras a anunciar…segredo), que desde logo se assumiram presentes neste projecto…

Não descurando os apoios que temos e que neste momento se estão em fase final de execução, como seja o apoio de uma cadeia de venda de artigos desportivos.

TP - Quais as diferenças e semelhanças que encontras entre as provas de Trail Running Portuguesas e as estrangeiras?

PG – Semelhanças: o mesmo entusiasmo e camaradagem

Diferença: em termos de dimensão, na verdade só participei em provas de grande envergadura internacional, com meios logísticos e humanos de maior envergadura. Pela dimensão de alguns mercados e reputação de muitas das provas, as grandes marcas já se começam a fazer sentir.

TP - Quais os teus principais objetivos no mundo do Trail Running?

PG – Em termos pessoais melhorar tecnicamente. A base está lá, como atleta, agora a técnica…. Como diz o Sá “tens de ganhar cabedal e melhorar nas descidas senão um tipo mais fraco passa-te de certeza…”  quem sabe …sabe

Em termos associativos, com uma  equipa fantástica e coesa, tornar o Desnível Positivo uma referência!

TP - Que mensagem gostarias de deixar a todos os traillers Portugueses?

PG – “Safam-se ou é só beijinhos?” … agora a sério desfrutem deste desporto, divirtam-se (sofram um bocado) e sempre, com um sorriso na cara…